"No entendimento comum, a criação é o destino de alguns eleitos,
gênios, talentos que criaram grandes obras artísticas, fizeram notáveis
descobertas científicas ou inventaram alguns aperfeiçoamentos na área
técnica. Reconhecemos de bom grado e prontamente a criação na atividade
de Tolstoi, Edison e Darwin, porém é corriqueiro pensarmos que na vida
de uma pessoa comum não haja criação.
No entanto, [...] esse ponto de vista é incorreto. Segundo uma analogia
feita por um cientista russo, a eletricidade age e manifesta-se não só
onde há uma grande tempestade e relâmpagos ofuscantes, mas também na
lâmpada de uma lanterna de bolso. Da mesma forma, a criação, na verdade,
não existe apenas quando se criam grandes obras artísticas, mas por
toda parte em que o homem imagina, combina, modifica e cria algo novo,
mesmo que esse novo se pareça a um grãozinho, se comparado às criações
dos gênios. Se levarmos em conta a presença da imaginação coletiva, que
une todos esses grãozinhos [...] da criação individual, veremos que
grande parte de tudo o que foi criado pela humanidade pertence
exatamente ao trabalho criador anônimo e coletivo de inventores
desconhecidos.
[...] É claro que expressões superiores de
criação foram até hoje acessíveis apenas a alguns gênios eleitos da
humanidade, mas, na vida cotidiana que nos cerca, a criação é condição
necessária da existência, e tudo que ultrapassa os limites da rotina,
mesmo que contenha um iota do novo, deve sua origem ao processo de
criação do homem".
LEV VIGOTSKI (1930)
Fonte:
VIGOTSKI, L. Imaginação e criação na infância. (Trad. Zoia Prestes). São Paulo: Ed. Ática, 2009. (Trabalho original de 1930).